sexta-feira, outubro 19, 2012

Em uma curta aula sobre angústia


Ontem no Seminário os alunos do 3º e 2º anos participavam juntos de uma aula com a síntese de Angústia, livro de Graciniano Ramos. Ao término o Pastor Marcos perguntou: QUAL SUA ANGÚSTIA PESSOAL? E todos tinham que responder...

Entre respostas sinceras e outras toscas, concluí algumas coisas:

1 - Todos temos nossas angústias, em diferentes graus de complexidade, mas todos as temos.
2 - No meio evangélico, a maioria está relacionada com a insatisfação de nossa espiritualidade, e a com  vida cristã em nossos dias.
3 - A solução não parece próxima ou de simples solução.

Saí daquela aula meio que sem esperanças, até nosso mestre docente externou suas dores. Com a diferença de ao menos ter apontado uma solução para esses futuros líderes e pastores: ter um ombro amigo para dividir aquilo que no ministério será inevitável.

terça-feira, outubro 16, 2012

Coisa de Criança




Por onde Jesus passava era possível ver crianças correndo em volta e se misturando na multidão. Os discípulos tentaram impedir que as crianças se amontoassem no colo de Jesus. Achavam que Jesus tinha coisa mais importante para fazer do que dar atenção às crianças, mas acabaram descobrindo que não apenas as crianças gostavam de Jesus, mas Jesus também gostava das crianças. Numa dessas ocasiões, Jesus pegou uma criança no colo e deixou muito claro que quem não se torna igual a uma criança não pode entrar no reino dos céus, pois o reino dos céus pertence aos que são semelhantes às crianças [Mateus 18.1-5; 19.13-15]. Naquele dia as crianças se tornaram um padrão para a espiritualidade cristã.

Evidentemente, Jesus não pretendia que nos tornássemos iguais às crianças em todas as dimensões da infância. As crianças, por exemplo, não sabem o que é a gratidão, pois não têm noções de medidas abstratas. Não têm condições de avaliar o que é feito por elas, não sabem quanto sacrifício é necessário para que sejam cuidadas e não têm critérios para os custos da dedicação dos pais ou o valor das coisas que são oferecidas a elas. Por isso é que os pais vivem dizendo “diz obrigado para a titia”, “já disse obrigado para o vovô?”, pois se não o fizessem, as crianças simplesmente pegariam o presente e sairiam correndo para brincar. As crianças também não têm noções de tempo, distância e volume. Por isso é que usam palitos de fósforo para marcar quantos dias faltam para o passeio no zoológico, numa viagem longa perguntam de cinco em cinco minitutos se está chegando, e de noite, antes de irem para a cama, abrem os braços e dizem com aquele sorriso lindo “mamãe, eu te amo desse tamanho assim”.

As crianças também estão absolutamente fora das categorias sociais de valores e importância. Tratam o general com a mesma displicência com que tratam o zelador do prédio onde moram, e falam as maiores barbaridades quando percebem algo inusitado em algum adulto que pretende conquistar sua simpatia, deixando os pais ruborizados e constrangidos. Elas não sabem quem é importante e quem não é. Elas ainda não foram contaminadas com os paradigmas do mercado, que valora pessoas de acordo com posição social, conta bancária, ou potencial de favorecimento e trocas de favores. Não fazem a menor ideia, por exemplo, de que é preciso um sorriso de plástico para o senhorio que chegou para tratar do aumento do aluguel, ou demonstrar especial apreço ao chefe que veio para o jantar. Isso significa que uma criança jamais perguntaria para Jesus “quem é o mais importante no reino dos céus?”, pois não lhes passa pela cabeça que um ser humano pode ser maior ou menor do que o outro em termos de valor intrínseco – aliás, nem imaginam que exista ou o que seja esse tal de “valor intrínseco”.

A exortação de Jesus aos seus discípulos sublinha exatamente esses traços próprios das crianças: o absoluto despojamento das disputas de poder e a absoluta ignorância a respeito das hierarquias que separam os seres humanos uns dos outros, e promovem toda sorte de guerras e conflitos, que somente se justificam pela vaidade e o orgulho dos egos que pretendem se afirmar às custas da diminuição e destruição dos demais.

Como seria o mundo se todos tivessemos o coração das crianças? Teríamos breves desentendimentos, logo seguidos de um enxugar de lágrimas e a correria reiniciada rumo à próxima brincadeira. Haveria mais cooperação e menos competição, mais perdão e menos ressentimento e ódio, mais partilha e menos acúmulo, mais brincadeira e menos agressões, mais amores e menores dores. O rabino Harold Kushner disse que as crianças perdoam rápido, e se reconciliam na velocidade da luz, pois “preferem ser felizes a ter razão”. São simples, e humildes, não se constrangem com vitórias e derrotas, pois não competem, apenas brincam. Não estão no jogo de “quem é o maior e quem é o menor”.

O reino de Deus é um reino para gente com coracão de criança. Todo mundo brincando de roda, cada um segurando na mão do outro, sem restrição para quem chegar, apoteose da fraternidade universal, sob a benção do Pai, do Filho e do Espírito Santo, numa santa e bendita folia. Coisa de criança.

Ed René Kivitz, disponível em IBAB

quarta-feira, outubro 10, 2012

ABBA


ABBA


Gostamos de explicar as coisas, de graduá-las, delimitá-las em conceitos que nos caibam na mente e nos façam sentido. Mas as coisas mais profundas da vida são inexplicáveis e intraduzíveis. Uma das que nos causam mais alumbramento é quando, pais, ouvimos o balbuciar de “pai” da boca de nossos filhos pequenos. O que não faríamos para abraçá-los e protegê-los de qualquer coisa?

Abba é antes de palavra, antes de conceito, pra não dizer mais do que conceito.
Abba é a expressão usada pela criança quando reconhece a presença segura do pai. Sua melhor tradução seria “papa” ou mesmo “pa”.

Ouvi uma história esses dias. Num terremoto que aconteceu na Turquia há poucos anos, os bombeiros foram chamados desesperadamente por um pai que havia ouvido a voz de seu filho e de outras crianças sob escombros de uma escola. Chegando ao local, conseguiram abrir espaço para retirar as crianças. O pai esperava ansioso ali fora, beirando ao desespero para abraçar logo seu filho. Assim que o espaço foi aberto o pai gritou pelo menino. Todas as crianças saíram de debaixo do concreto e ferro retorcidos e, por último, o seu filho. Assim que o menino saiu, seu pai o agarrou e perguntou: “por que você foi o último a sair meu filho? “, ao que o menino respondeu: “porque eu ouvi a tua voz e sabia que estaria aqui fora me esperando e meus amigos não tinham ninguém esperando por eles aqui”.

Abba é presença que acalenta, que acolhe nos braços e dá segurança, que nos põe de pé e nos projeta, autônomos, mas nunca desamparados, para a vida.

Abba não é conceito que se explique, que se delimite, que se descreva. É algo que se sente e se usufrui. Por isso não me peça para explicá-lo pois, se você pedisse a um de meus três filhos que me “explicassem” para você, não conseguiriam fazê-lo. Mas, dia desses, a Miryana voltava pra casa à pé com meu filho Thiago, quando começou a chover e trovejar de repente. Thiago tinha muito medo de chuva (não tem mais depois de que tomamos um banho debaixo de uma tempestade). Ele logo se agarrou nela e disse: “Eu quero meu pai”. Ele saberia te explicar pouca coisa sobre mim, mas sabia que precisava de mim e que eu faria de tudo pra chegar até ele e, chegando, o agarraria e ele se sentiria seguro.

O convite é o de nos lançarmos ao colo e chamarmos “Abba” para, mesmo em meio às incertezas e inseguranças, usufruirmos da presença que nos aquece e do abraço apertado e demorado, cujo som é o das batidas de Seu coração.

Para usufruir disso, não se precisa de explicação.

É só chamar: “Abba!”

Fabricio Cunha® ( disponível em http://fabriciocunha.com.br/)